Longevidade: uma conquista com repercussões econômicas e sociais
Expectativa de vida do brasileiro continua aumentando mesmo após a pandemia; mas indicador tem sérios reflexos nos custos com a saúde e a previdência. Por: Cintia Nunes
A evolução da longevidade da população brasileira, evidenciada por dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), como o aumento da expectativa de vida média para 75,5 anos em 2022, representa uma conquista inegável para a população e reflete avanços significativos na qualidade de vida e desenvolvimento humano. No entanto, traz desafios e responsabilidades que precisam ser considerados, especialmente em relação aos custos públicos e privados para financiar a saúde, os benefícios e os cuidados com as pessoas idosas.
Segundo o sociólogo, doutor em Demografia e ex-pesquisador do IBGE, José Eustáquio Diniz Alves, a expectativa de vida no Brasil vem crescendo há 100 anos, acompanhando a tendência mundial. A crise sanitária causada pela Covid-19 quebrou essa onda crescente.
“A pandemia diminuiu a expectativa de vida, mas o índice começou a se recuperar em 2022 e, no ano passado, voltou ao patamar pré-pandemia”, explica. O pesquisador adianta que as projeções mundiais já apontam para uma nova onda de crescimento da expectativa de vida, com índices superiores aos observados antes da pandemia.
O IBGE estima que 25% da população brasileira terá mais de 65 anos em 2060 — o que significará menos trabalhadores contribuindo para o sistema previdenciário e mais aposentados dependendo de recursos para viver.
Uma visão diferente para os números de expectativa de vida vem do Instituto Cidades Sustentáveis. Publicado no último dia 26 de março, o Mapa da Desigualdade entre as capitais mostra os dados da idade média do brasileiro ao morrer. O estudo inédito levou em conta 40 indicadores como educação, saúde, renda, habitação e saneamento, em 26 capitais brasileiras. De acordo com os dados, a idade varia de 57 a 72 anos, a depender da cidade.
O coordenador de Relações Institucionais do Instituto Cidades Sustentáveis, Igor Pantoja, explica que esses dados estão relacionados às condições de vida das pessoas no momento da medição. “A idade média ao morrer tem a ver com questões de infraestrutura, acesso ao saneamento e à saúde e mortalidade juvenil e infantil. Por isso, a população de cidades do Norte morre mais cedo do que em outras regiões. Provavelmente, por oferecer piores condições de vida e de acesso ao saneamento e à saúde”, define.
Os melhores indicadores foram observados em Belo Horizonte (MG) e Porto Alegre (RS), onde a média de idade ao morrer é de 72 anos. O pior fica em Boa Vista (RR), com 57 anos.
DIFERENÇA DOS DADOS
Apesar de frequentemente utilizados como sinônimos, os termos expectativa de vida e idade média ao morrer têm definições e interpretações distintas. O primeiro, também chamado de esperança de vida, é uma estimativa probabilística do tempo que um indivíduo nascido em um determinado ano espera viver, considerando as taxas de mortalidade da época. Esse é o indicador usado para o cálculo da previdência.
Já a idade média ao morrer indica a faixa etária que as pessoas têm ao morrer em um período específico, refletindo as taxas de mortalidade e a estrutura etária da população naquele momento.
Para José Eustáquio Diniz Alves, é necessário ter cautela ao falar sobre expectativa de vida, pois o mapeamento do Instituto Cidades Sustentáveis traz números de idade média ao morrer que podem ser afetados pela migração, por exemplo. Ele explica que a expectativa de vida ao nascer é calculada com base em uma metodologia muito complexa.
“As pessoas em determinados lugares podem estar melhorando de vida, migrando para outra região decadente ou onde aconteceu um desastre natural, por exemplo. Nesses casos, a média de idade das mortes pode diminuir. Mas isso é diferente de expectativa de vida”, ressaltou o demógrafo.
Na visão de Pantoja, os dois indicadores podem andar lado a lado – e as projeções desenham o andar da qualidade de vida da população brasileira, além de indicar quais políticas públicas devem ser aplicadas e em que lugar.
“Em uma cidade com mortalidade infantil muito alta, em que o poder público atua para reduzir esse dado e consegue ter resultados positivos concretos, haverá menos crianças morrendo. Isso também aponta para um aumento da expectativa de vida futura. Assim, pode-se atuar olhando para um futuro mais longevo”, explicou.
Seja expectativa de vida, seja idade média ao morrer, é importante ressaltar que a longevidade não deve ser vista apenas como um problema. Tanto Alves quanto Pantoja destacaram que os indicadores são uma oportunidade para repensar a organização social e econômica do País. Na opinião de ambos, a crescente população de idosos, por exemplo, representa um potencial de consumo e de contribuição para a sociedade que não deve ser subestimado.
DESASTRES NATURAIS
As mudanças climáticas, no entanto, podem afetar o crescimento do indicador de expectativa de vida do IBGE. Eventos climáticos extremos, como ondas de calor e frio, já causam aumento da mortalidade, especialmente entre crianças e idosos.
Apesar disso, a Organização das Nações Unidas (ONU) afirma, em seu relatório “Situação Econômica Mundial e Perspectivas 2024″, que a longevidade continuará crescendo, mas em um ritmo menor do que o vivenciado no último século. Mas o documento adverte para o aumento da intensidade dos impactos e prevê um agravamento dessas condições.
O ex-pesquisador do IBGE explica que catástrofes climáticas de grandes proporções sempre aconteceram ao longo da História, mas estão mais frequentes. “Estudos mostram que milhões de pessoas morrem em virtude de eventos climáticos, mas a expectativa é que a vida média das pessoas continue aumentando, embora em ritmo menor”, projeta Alves.