Com demanda em alta, mercado imobiliário impulsiona produtos de seguros
Além do Seguro Garantia e do Responsabilidade Civil de Obras, o mais contratado pelo setor é o de Riscos de Engenharia, que cresceu 12,2% em 2024, chegando a movimentar prêmios de R$ 1,1 bilhão. Por: Bianca Rocha
Um dos motores da economia brasileira, o setor de construção civil acumulou bons resultados nos últimos anos. O nível de atividades hoje é superior ao período pré-pandemia, perdendo apenas para o pico atingido em 2014, no auge das obras para a Copa do Mundo no Brasil naquele ano e as Olimpíadas no Rio de Janeiro, em 2016. Os números atuais confirmam esse cenário: em 2024, o crescimento foi de 4,3%, e o PIB, de R$ 359,5 bilhões — que representa quase 6% do PIB total do País —, segundo dados da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC).
O desempenho do setor está sendo impulsionado pelo mercado imobiliário. Nunca se lançou tantas unidades residenciais como no ano passado, principalmente por meio do programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV), que ganhou novas regras e subsídios do Governo Federal. O número de imóveis lançados no País subiu 18,6% em 2024, alcançando 383,5 mil unidades — mais da metade delas enquadradas no MCMV. As unidades de médio e alto padrões também se destacam, especialmente no valor de vendas, que cresceu 23,8% em relação a 2023.
Uma certa resiliência, no entanto, acompanha esse crescimento. Dois fatores têm andado colados com os investimentos imobiliários nos últimos tempos: a alta do custo de insumos de obras, que se intensificou no pós-pandemia e depois da guerra na Ucrânia, e a evolução da Taxa Selic, que vem subindo desde setembro do ano passado e hoje está em 15%.
O alto custo dos materiais destinados à construção civil afetou a viabilidade de empreendimentos e levou empresas a rever seus projetos para fechar as contas, mas não chegou a frear os lançamentos. Com a demanda crescente, as construtoras seguiram com novos projetos em todo o País (capitais e cidades do interior). A Selic, embora impacte o crédito imobiliário, não influencia os investimentos do MCMV, uma vez que o funding do programa vem do FGTS, que tem regras de subsídio e taxas de juros próprias.
Claudio Hermolin, presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado do Rio de Janeiro (Sinduscon-Rio), ressalta que o mercado imobiliário tem um ciclo longo, que envolve compra de terrenos, elaboração dos projetos, lançamentos, obras e entrega, o que pode levar até cinco anos.
“A alta da Selic não nos impacta no curto prazo. Apesar da elevação dos juros em 2024, as construtoras já tinham projetos contratados e financiamentos fechados. Neste ano, ainda teremos um volume grande de início de obras, referentes aos projetos lançados no ano passado. Se houver um arrefecimento de lançamentos em 2025, no ano seguinte já poderemos observar uma queda”, afirma.
A expectativa da CBIC para 2025 é de crescimento moderado, com expansão de 2,3% no setor de construção civil. “A alta taxa de juros é apontada como um fator que pode impactar a expansão do setor, especialmente no mercado imobiliário de média e alta rendas e nas pequenas obras e reformas”, acredita o presidente da CBIC, Renato Correia.
Para Luiz França, presidente da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), as perspectivas são positivas, mesmo em um ambiente de juros elevados. “Há uma base sólida para crescimento sustentável do setor, com incorporadoras capitalizadas e demanda consistente. O País tem um déficit habitacional acima de sete milhões de moradias e uma demanda que vai superar 11 milhões de unidades nos próximos dez anos”.
SEGUROS CRESCEM
O mercado imobiliário mobiliza uma ampla rede de fornecedores: de prestadores de serviços de arquitetura, engenharia e decoração a indústrias de materiais para obras e de bens de capital. O setor de seguros, especialmente, vem colhendo os louros do boom de lançamentos no País. Há três tipos de apólices que usualmente são contratadas quando uma construtora começa a erguer um empreendimento na planta: Riscos de Engenharia, Seguro Garantia e Responsabilidade Civil de Obras.
O prêmio do seguro de Riscos de Engenharia tem crescido ano a ano desde 2022, quando somou R$ 851 milhões. Em 2023, foram R$ 981 milhões, alta de 15,3% em relação ao ano anterior. Em 2024, a evolução foi de 12,2%, com faturamento de R$ 1,1 bilhão. Não existe uma lista oficial de atividades que mais contratam esse tipo de seguro, mas o presidente da Comissão de Riscos de Engenharia da FenSeg, Luciano Martins, estima que o mercado imobiliário seja hoje responsável por cerca de 30% da receita desse produto.
Entre as coberturas básicas, estão danos provenientes de causas externas ou intempéries da natureza, como queda de raio, incêndio, vendaval e explosão; erro de projeto que possa causar dano físico à obra, entulho, equipamentos, ferramentas e contra roubo de materiais, entre outros. “Nas grandes cidades, o roubo de materiais na obra é uma das maiores preocupações”, acrescenta Martins. A sinistralidade da carteira caiu 36,1%, entre 2023 e 2024, chegando a R$ 406 milhões.
Não há obrigatoriedade de contratação de seguro de Riscos de Engenharia, a não ser em contratos de obras públicas ou cláusulas de financiamento bancário, que exijam a obtenção desse e de outros seguros. No setor privado, grandes construtoras do eixo Rio-São Paulo são as contratantes mais comuns desse tipo de seguro, mas há um interesse crescente de pequenas e médias empresas em outras grandes capitais por esse tipo de apólice.
“Ainda falta conhecimento sobre esse produto e como ele pode proteger as empresas ao longo das obras. Mas, depois do que aconteceu no Rio Grande do Sul, e com a maior incidência de catástrofes climáticas, a consciência vem mudando”, afirma Martins, acrescentando que a maioria das seguradoras tem interesse em expandir a carteira desse produto. “É um nicho que o mercado gosta de atuar, embora a alta concorrência às vezes pressione o valor do prêmio, que acaba caindo e impactando a receita”, explica.
DANOS A TERCEIROS
Além da possibilidade de incluir a cobertura de Responsabilidade Civil de Obras na carteira de Risco de Engenharia, também há um seguro dedicado a cobrir danos a terceiros em atividades da construção civil, com mais coberturas incluídas: o RC Obras, que concentra cerca de 40% da arrecadação de RC Geral, ramo que teve um crescimento de 32% entre 2022 e 2024, passando de R$ 1,5 bilhão para R$ 1,98 bilhão, e que, na percepção do mercado segurador, deve seguir nesse ritmo, surfando no desempenho do mercado imobiliário.
Entre as coberturas básicas do RC Obras estão danos materiais, corporais e morais causados a terceiros, lucros cessantes de terceiros e custos com defesa judicial perante reclamação de terceiros. “Nas coberturas adicionais, podem ser incluídos erros de projeto que causem danos a terceiros, poluição súbita e acidental e o RC empregador, que cobre morte e invalidez eventual de empregados e que é, de longe, a cobertura com maior impacto na sinistralidade da carteira”, diz Fábio Barreto, presidente da Comissão de Responsabilidade Civil da FenSeg.
O Seguro Garantia também vem sendo beneficiado pela expansão do setor imobiliário. A apólice assegura que projetos sejam entregues mesmo diante de dificuldades financeiras ou operacionais do construtor e, caso o contratado não cumpra suas obrigações, a seguradora assume a conclusão da obra ou indeniza o contratante. Na construção civil, especialmente em empreendimentos na planta, esse seguro oferece segurança para investidores e compradores, minimizando riscos financeiros relacionados à paralisação ou ao abandono da obra.
“O mercado imobiliário enfrenta desafios como alta volatilidade econômica, aumento do custo de insumos e mudanças regulatórias que podem atrasar ou encarecer projetos. Essa conjuntura eleva o risco de inadimplência ou descumprimento contratual nas obras. Por isso, o Seguro Garantia ganha relevância”, ressalta Ketlyn Stefanovic, presidente da Comissão de Crédito e Garantia da FenSeg.
Entre 2023 e 2024, a arrecadação desse tipo de seguro aumentou 17,6%, chegando a R$ 5,1 bilhões. As indenizações caíram 44% no período, somando R$ 565 milhões no ano passado.