ENSINO FORMAL É ESPINHA DORSAL PARA EVOLUÇÃO DO MERCADO SEGURADOR

ENSINO FORMAL É ESPINHA DORSAL PARA EVOLUÇÃO DO MERCADO SEGURADOR

ONU diz que, se todos os adultos concluíssem o ensino médio até 2030, cerca de 420 milhões de pessoas poderiam sair da pobreza e haveria alta no PIB de países em desenvolvimento.

Por: Vagner Ricardo

Gargalos na educação formal de qualidade podem afetar o desempenho futuro de vários mercados, incluindo o de seguros. Isso porque as pessoas mais bem escolarizadas têm maior capacidade de identificar riscos e de escolher coberturas de seguros adequadas para mitigá-los, além de ter renda para ampliar o patrimônio a ser protegido ao longo da vida laboral.

 

Dados da ONU destacam que, se todos os adultos concluíssem o ensino médio até 2030, cerca de 420 milhões de pessoas poderiam sair da pobreza no mundo, e o PIB dos países em desenvolvimento avançaria 10% na próxima década. O dado acende luzes sobre o andamento do Plano Nacional de Educação (PNE), um ponto de atenção a ser monitorado, já que a maioria das metas estabelecidas no programa decenal – com vigência até 2024 – será descumprida, trazendo prejuízos a gerações futuras de consumidores em conhecimento, renda e oportunidades de empregos.

 

“Além de ser fundamental na geração de renda e na própria demanda qualificada por seguro, a educação é, em larga medida, observável por meio de indicadores de escolaridade e de proficiência (aprendizado). Logo, o cumprimento das metas de educação é fundamental para o futuro do País e da indústria de seguros”, assinala o economista Marcelo Neri, diretor do FGV Social e fundador do Centro de Políticas Sociais (FGV Social/CPS).

 

O relatório mais recente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) indica que várias das metas do PNE, incluindo a de elevar a escolaridade média da população de 18 a 29 anos para 12 anos de estudo e aumentar a taxa de matrícula na educação superior, não serão atingidas até 2024.

 

No caso do aumento da escolaridade, o Inep constata que “os indicadores apresentaram tendência de crescimento entre 2012 e 2021, mas em ritmo lento, o que deve impossibilitar o alcance dos objetivos até 2024”. Em 2021, pouco mais de 40 milhões de jovens entre 18 e 29 anos não tinham ensino médio completo. A escolaridade média de negros era de 11,3 anos e a de não negros, de 12,4 anos. A meta era zerar a desigualdade.

 

Também faz água a meta nº 12, a de elevar a Taxa Bruta de Matrícula (TBM) na educação superior para 50%, e a Taxa Líquida de Escolarização (TLE) para 33% da população de 18 a 24 anos, com expansão mínima de 40% das novas matrículas no segmento público.

 

O Inep reporta que todos esses indicadores permanecem abaixo do planejado. A TBM atingiu 37,4% em 2021, enquanto a meta para 2024 é de 50%. “A TLE ficou em 25,5% no mesmo período. A participação do segmento público na expansão de matrículas de graduação foi de 3,6% entre 2012 e 2020, muito distante dos 40% estipulados”, relata o Inep.

 

Sobre triplicar as matrículas de educação profissional técnica (meta nº 11) de nível médio, o Inep reconhece que a meta está comprometida ao subir apenas 15,5% entre 2013 e 2021. Para cumpri-la até 2024, seria necessário um crescimento de 200%, totalizando 3,2 milhões de matrículas.

 

META CUMPRIDA

Enquanto isso, a meta de elevar a qualidade da educação superior e de ampliar a proporção de mestres e doutores do corpo docente foi cumprida. Segundo o Inep, o objetivo de atingir 75% dos docentes com mestrado ou doutorado foi alcançado em 2015 e chegou a 83,8% em 2020. No mesmo ano, o número de doutores chegou a 48,9% (a meta era de, no mínimo, 35%).

 

As razões de as metas do PNE não serem alcançadas devem ser alvo de intenso debate nos próximos meses, já que a vigência do segundo plano (Lei 13.005, de 2014) finda em junho do próximo ano. Em razão disso, um projeto de lei que trata do próximo PNE deverá ser enviado pelo Governo Federal ao Congresso Nacional ainda neste ano.

 

A essa altura, considerando as projeções do atual PNE, os investimentos em educação pública já deveriam ter alcançado o mínimo de 7% do PIB do País — meta para o quinto ano de sua vigência — e estar a caminho de 10% no final do decênio (2024). A realidade é outra: o percentual foi de 5% em 2019 e de 5,1% em 2021. Os governos municipais tiveram maior participação no total de gastos públicos, constata o Inep.

 

Especialistas destacam que o atual PNE foi muito prejudicado por cortes orçamentários e pela pandemia da Covid-19 nos últimos três anos, exigindo que metas das duas últimas edições do plano decenal sejam repetidas.

 

AGENDA ESTRATÉGICA

Responsável por presidir a Subcomissão Temporária para Acompanhamento da Educação na Pandemia, o senador Flávio Arns entregou um relatório ao vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, com 30 recomendações para a recuperação dos sistemas de ensino e formulação de uma agenda estratégica para os próximos anos, informa a Agência Senado.

 

A principal é a de que o novo Plano Nacional de Educação deva ser posicionado como elemento central do planejamento das políticas educacionais nos próximos anos. O relatório, fruto de 15 meses de trabalho, constata a evolução insatisfatória do atual PNE, já que o nível de sua execução não passa de 40%, na média.

 

Tendo em vista algumas de suas principais ambições (erradicação do analfabetismo, universalização do atendimento escolar e superação das desigualdades educacionais), o senador propõe regras de responsabilidade educacional, a exemplo da Lei de Responsabilidade Fiscal, para nortear a atuação dos gestores públicos na área da educação.

 

A seu ver, os gestores precisam enxergar o PNE como uma lei com metas impositivas a todos, sob pena de consequências jurídicas aos responsáveis pela sua execução. Aliás, essa proposta consta de seu projeto de lei (PL 88/2023) que, entre outras ações, prevê que descumprimento das metas do PNE poderá ser considerado crime de improbidade administrativa, resultando em punições até de prefeitos e governadores.

 

Em meio aos debates que antecedem o novo PNE, o Governo Federal decidiu suspender, em abril, a vigência do novo ensino médio, modelo escolar criado pela Lei 13.415 de 2017. Reconheceu falhas em suas propostas de ofertar ensino de qualidade, em ambiente propício aos estudos e reduzir o abandono escolar.

 

JANELA DE OPORTUNIDADE

O economista Marcelo Neri vê uma janela de oportunidade nesse rearranjo a caminho da reforma do ensino médio. “O maior experimento aleatório já realizado sobre educação financeira foi implementado no Brasil.  Há muitas lições a serem incorporadas nos programas de ensino. Por exemplo: os deveres de casa dos alunos de nível médio realizados com os pais aumentam a cidadania financeira de todos. Deve-se aproveitar essa parada da reforma para incorporar conteúdos que tratam da vida profissional e de aspectos da vida privada dos estudantes, incluindo aí educação em finanças/seguros”, diz Neri.

 

Algumas propostas para vencer a alta taxa de evasão escolar no ensino médio chamam atenção e tentam, dessa forma, abrir as portas das universidades aos estudantes. Uma das mais promissoras é a que prevê o financiamento estudantil.

 

Não é tarefa fácil, contudo, olhando os números do Inep – 5,5% dos alunos do ensino médio da rede estadual abandonaram a escola em 2019, invertendo a trajetória de queda registrada desde 2010 – ou do Mapa do Ensino Superior – o Brasil registrou queda de 6% das matrículas de estudantes provenientes de escolas públicas, em 2020.

 

O paper “Incentivos financeiros a estudantes do ensino médio: o que sabemos sobre essa política?”, de Livia Haddad e de Vladimir Ponczek, estudante de graduação em Economia e professor associado na Escola de Economia de São Paulo da FGV, respectivamente, e de Cristine Pinto, professora titular do Insper, traz recomendações sobre esses programas, que não devem ser vistos como ‘bala de prata’ para os problemas da educação, mas não deixam de ser uma contribuição significativa. Segundo eles, o programa deve ter metas claras, foco e garantia de que seus objetivos serão alcançados. Não há resposta pronta, mas não há dúvida de que a educação formal de qualidade é o passaporte para haver seguros para tudo e para todos.