MERCADO SE MOBILIZA CONTRA ATUAÇÃO DESLEAL DAS ASSOCIAÇÕES

MERCADO SE MOBILIZA CONTRA ATUAÇÃO DESLEAL DAS ASSOCIAÇÕES

As associações de proteção veicular não querem se enquadrar no Código de Defesa do Consumidor, não admitem ser fiscalizadas pelo Poder Público e entendem que não estão sujeitas ao pagamento de tributos

Por: João Maurício Carneiro

AConfederação Nacional das Seguradoras – CNseg, em conjunto com as principais entidades de representação do setor de seguros estruturou diversas ações de comunicação, com o tema “Proteção veicular não garante proteção”, para alertar e esclarecer a sociedade sobre como a concorrência desleal das associações de proteção veicular prejudica o consumidor e compromete a reputação institucional dos seguros no País.

 

A iniciativa é composta por site (www.seguroautosim.com. br), vídeos e cartilha. Espalhadas por todo o País, as associações podem se tornar um problema de enorme gravidade, sem qualquer controle de sua solidez financeira para oferecer irregularmente produto equiparável a seguro, segundo avaliação do setor de seguros. “Diversas associações não obedecem à legislação e vendem irregularmente produtos com o nome de seguros, argumentando que são sociedades fechadas, quando não são. Estão sendo criadas sem qualquer regulação e deixando os consumidores desprotegidos, pois estão fora do radar da Superintendência de Seguros Privados (Susep) e até dos Procons, o que gera um aumento cada vez maior do volume de reclamações”, ressalta Marcio Coriolano, Presidente da CNseg.

 

O órgão de supervisão do setor de seguros enfrenta crescimento significativo na quantidade de reclamações por parte dos consumidores prejudicados pelas associações. “Porém, como não são seguradoras, a Susep não pode autuar e punir. Tendo verificado que essas associações estão atuando como se fossem seguradoras, a Autarquia manda a denúncia para o Ministério Público, para que apurem as infrações e então haja a punição”, afirma Coriolano.

 

A legislação brasileira não proíbe a existência de sociedades associativas que ofereçam proteções de seguro veicular para seu público restrito, sob o regime de rateio de despesas. No entanto, como explica Marcio Coriolano, existe uma ‘falha regulatória’, pois o Decreto-Lei nº 73/66 considera como integrantes do sistema o Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP), a Susep, os resseguradores, as sociedades seguradoras e os corretores. Não há previsão para a atuação de associações na atividade securitária. Essa situação só será resolvida com a aprovação de um projeto de lei que está sendo discutido na Câmara dos Deputados.

 

De autoria do Deputado Lucas Vergílio (PSD-GO), o Projeto de Lei 3139/15 foi discutido em audiência pública na Câmara com a participação das seguradoras, associações de proteção veicular, corretores, órgãos de defesa do consumidor e advogados da área de seguros. Esse Projeto, hoje PLP nº 519/18, foi alterado para contemplar a inclusão das associações no ambiente de supervisão da Susep e de sua tributação nos moldes da atividade securitária.

 

Marcio Coriolano destaca que o projeto foi inspirado na Lei 9656/98, que criou a regulação dos planos de saúde, incorporando as antigas associações fechadas de saúde. Na época, o segmento de saúde suplementar enfrentava os mesmos problemas dos seguros privados, com um mercado sem qualquer regulação. “Não podemos deixar os brasileiros à mercê de aventureiros e de associações que atuam à semelhança das pirâmides financeiras. Este é um momento delicado para o País, em que as pessoas

 

INSEGURANÇA JURÍDICA

 

O Professor de Direito do Consumidor na Escola de Direito de Brasília, Ricardo Morishita, afirma que o maior risco para o consumidor é aquele que ele não pode ver e, consequentemente, não entende a diferença substantiva entre o seguro irregular e o seguro tradicional. “Essa atividade comercial que contraria a legislação brasileira traz uma preocupação imensa para todos nós e expressa uma insegurança jurídica no País”, destaca.

 

O especialista demonstra preocupação com o surgimento de um terceiro gênero de instituições “que não é uma associação, mas veste roupa de associação para poder comercializar seguros”. Morishita destaca que tanto o Superior Tribunal de Justiça (STJ) quanto vários Tribunais Regionais já reconheceram que a venda de seguros por associações de forma aberta, no varejo, é ilegal. Mas aponta o perigo de um procedimento que se estabeleceu ao longo de anos. “Entra-se com uma ação para suspender aquela atividade, mas se cria uma nova associação.

 

Como há uma informalidade muito grande, e não há regulação suficiente, abrir e fechar é muito simples”, explica. Em razão dessa realidade, a Susep já moveu 353 ações civis coletivas contra entidades que vendem seguros irregularmente, pedindo o encerramento das suas atividades. “Nosso objetivo é proteger tanto o consumidor, quanto o mercado de seguros, pois o consumidor acaba achando que adquiriu um seguro tradicional, o que afeta também outras categorias, como seguro residencial e de vida, por exemplo”, destaca o chefe da Coordenação Geral de Estudos e Relações Institucionais da Susep, Paulo Roberto Miller.

 

A declaração foi dada durante webinar sobre o mercado irregular na América Latina, promovido pela CNseg, em 21 de junho, que reuniu lideranças do setor do Chile, Uruguai e Paraguai. Miller explica que as ações judiciais são o instrumento mais eficaz que a instituição tem em mãos para coibir essa prática irregular no mercado. No entanto, adverte que essas ações atacam o sintoma, mas não a causa. Segundo ele, a Susep tem uma agenda de reformas regulatórias para proporcionar maior flexibilidade para a inovação das empresas, com simplificação e diminuição têm recorrido ao seguro, como nunca antes, para proteger o patrimônio, a vida e a família”, afirma o deputado Lucas Vergílio.

 

O parlamentar informa que o objetivo sempre foi o de defender o lado mais frágil, que é o consumidor. “Muitas vezes, as pessoas não têm informações suficientes e acabam sendo iludidas por entidades que prometem mundos e fundos, mas não têm como garantir o cumprimento dos contratos”, ressalta. Durante o XXI Congresso dos Corretores de Seguros, em 2019, a empresa de consultoria internacional EY apresentou uma pesquisa sobre o mercado “pirata”, contabilizando aproximadamente 700 associações e cooperativas operando no Brasil.

 

Segundo o sócio da consultoria, Nuno Vieira, as principais conclusões do estudo são a de que o mercado de Associações de Proteção Veicular (APVs) vale cerca de 20% a 25% do mercado de seguro de automóvel do Brasil, com cerca de 4,5 milhões de associados. de regras. “Não se trata de fiscalizar nem regular essa atividade, mas de coibir a prática irregular, justamente o que as reformas regulatórias da Susep buscam resolver”, afirma.

 

DEFESA DO CONSUMIDOR

 

A venda de seguros de forma ilegal pelas associações de proteção veicular prejudica o consumidor na defesa do seu direito, no acesso ao objeto contratado, dificulta a atuação dos órgãos de defesa do consumidor e deixa o contratante em uma verdadeira zona de penumbra quanto a seus direitos. É o que afirma o Superintendente do Procon/BA e Presidente da Associação Brasileira de Procons, Filipe Vieira. “Ao buscar pagar valores módicos por meio dos seguros ilegais, o consumidor pode se colocar em posição de risco para si e para os outros, quando como ocorrer um sinistro”, destaca.

 

Filipe Vieira explicou que os Procons avaliam cada caso, tomando por base a natureza da atividade exercida por essas associações, desconsiderando, portanto, o nome jurídico adotado por aquela instituição. “É possível registrar atendimento no Procon, embora haja a ressalva de que não recomendamos a contratação desse tipo de seguro, por não ser um processo tão simples e imediato, dado o comportamento furtivo de muitas dessas empresas”. O Presidente da Procons Brasil acredita que a regulação do mercado terá o papel fundamental de direcionar a forma como a atividade vai ser prestada ao público e as garantias mínimas que podem ser asseguradas aos tomadores daquele serviço.

 

“A primeira vantagem é qualificá-los como efetivos consumidores, o que significaria a facilitação da defesa dos seus direitos e uma maior liberdade de atuação aos Procons. Quando a prestadora pertencer ao mercado regulado, a sensação de segurança jurídica para o consumidor vai ser muito maior”, complementa.

 

ATUALIZAÇÃO

A Procuradoria-Geral da República (PGR) manifestou-se pela inconstitucionalidade formal da Lei 20.894/2020 do estado de Goiás, que trata de normas protetivas aos consumidores filiados às Associações de Socorro Mútuo no estado.

 

Para o procurador-geral Augusto Aras a lei questionada regulamenta a prestação de serviços irregulares de seguro privado sob a forma de Associações de Socorro Mútuo (autogestão), sem que essas entidades estejam devidamente autorizadas a funcionar como seguradoras. Segundo Aras, isso demonstra, claramente, que o estado de Goiás usurpou as competências da União para fiscalizar as operações de natureza securitária, bem como para legislar sobre o tema. A manifestação foi em parecer enviado em 23/06, ao Supremo Tribunal Federal (STF), pela procedência da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6.753, ajuizada pela CNseg.