Montadoras e Seguros se Unem para Acelerar a Descarbonização
O Programa Mover estabelece metas inéditas para reduzir emissões de CO₂, ampliando exigências em segurança, eficiência energética e sustentabilidade e promete reposicionar o País na rota da economia verde. Por: Vagner Ricardo
As montadoras e seguradoras estão a caminho de ampliar a parceria entre os dois setores no campo da descarbonização. Às vésperas da COP30, que será realizada em Belém, o setor automotivo brasileiro apresenta ao mundo um novo marco regulatório. Trata-se do Programa Mover, que sucede o Rota 2030 e promete reposicionar o País na rota da descarbonização, combinando avanços tecnológicos em segurança veicular com metas inéditas de redução de emissões de CO2.
“O Mover vai muito além de estabelecer padrões de eficiência, ele atrela a emissão do veículo não só ao que sai do escapamento, mas também ao processo de produção do combustível. Ou seja, passamos a medir do ‘poço à roda’ e não apenas do ‘tanque à roda'”, explica Gilberto Martins, diretor de Assuntos Regulatórios da Anfavea.
O novo programa amplia exigências em três frentes: segurança veicular, eficiência energética e sustentabilidade. Entre os itens obrigatórios, estão tecnologias como frenagem autônoma e alerta de saída de faixa, que tornam os veículos mais preparados para sistemas semiautônomos. No campo ambiental, o diferencial é a meta de carbono. “Estamos trazendo a contabilidade completa das emissões. Isso é inovador e coloca o Brasil em posição de vanguarda”, afirma o executivo.
RECICLAGEM VEICULAR
O Mover também estabelece, pela primeira vez, metas obrigatórias de reciclagem veicular. Fabricantes terão de recolher carros em fim de vida útil ou sinistrados e reinserir materiais na cadeia produtiva. “A ideia é transformar sucata em matéria-prima, reduzindo custos e a pegada de carbono. É economia circular na prática”, resume Martins.
Segundo ele, as seguradoras podem ser importantes aliadas na meta de descarbonização das montadoras, que atualmente, estão focados na agenda da reciclagem. Ele lembra que algumas seguradoras já têm experiência em reciclagem e desmontagem de veículos e que a intenção da Anfavea é trabalhar em conjunto para criar um sistema de rastreabilidade desse processo.
“A legislação atual sobre desmanche visa principalmente ao controle de roubos, mas não aborda a sustentabilidade e a redução da pegada de carbono. A ideia é desenvolver, em parceria com a CNseg e as seguradoras, um arcabouço legal para que possamos atuar nesse projeto de reciclagem de forma contínua”, explica.
Com uma matriz energética considerada uma das mais limpas do mundo — quase 50% renovável —, o Brasil reforça sua aposta no etanol e no biodiesel. “Já temos uma larga escala de utilização do etanol, que é fundamental para a descarbonização, e deveríamos ampliar seu uso”, defende.
O diretor da Anfavea destaca ainda o projeto Combustível do Futuro, em discussão no Congresso, que prevê a produção de combustíveis sintéticos a partir da captura de CO2. “É uma tecnologia inovadora, ainda em estágio inicial, mas que será uma contribuição substancial para reduzir emissões.”
Na COP30, ao lado da CNseg e da CNI, a Anfavea levará o tema dos biocombustíveis e da reciclagem à mesa de negociações. “Queremos mostrar que a produção brasileira já nasce limpa. Produzir peças aqui, usar matéria-prima local e rodar veículos no Brasil significa menos carbono emitido em comparação a mercados como China e Europa.”
CAMINHO HÍBRIDO
Enquanto a Europa e a China enfrentam dificuldades com a adoção de veículos 100% elétricos, o Brasil busca um caminho híbrido. “O que vemos lá fora é que muitos consumidores ainda resistem ao carro totalmente elétrico, seja pelo custo, seja pela infraestrutura. Aqui, acreditamos que a transição passará pelo etanol híbrido e pelos biocombustíveis”, avalia Martins.
O executivo reconhece, porém, que a eletrificação representa também um caminho promissor e ressalta que alguns países, como a China, estão adotando a eletrificação total, impulsionados, em parte, pela necessidade de modernizar suas matrizes energéticas. O Brasil, contudo, tem a oportunidade de explorar diversas rotas tecnológicas.
“Isso significa que o Brasil não precisa se restringir exclusivamente aos veículos elétricos. Podemos, por exemplo, considerar os veículos híbridos, que combinam motorização elétrica com combustíveis como o etanol. Essa configuração, em termos de emissão de carbono, pode se equiparar à dos veículos elétricos, especialmente considerando o contexto da China”, assinala ele.
A preocupação com a segurança também entrou na pauta. Em São Paulo, a Anfavea participou de reuniões com o Corpo de Bombeiros sobre normas de carregamento de veículos elétricos. “O carro em si é seguro e testado. O que precisa de atenção são as instalações elétricas dos prédios e pontos de recarga. Sem padrões claros, o risco não vem do veículo, mas da infraestrutura”, adverte. Enquanto isso, as seguradoras avaliam o modelo de subscrição de riscos dos seguros para carros elétricos.
Com o Mover, o Brasil se prepara para exibir na COP30 um modelo de descarbonização que inova a partir de suas vantagens competitivas. Biocombustíveis, reciclagem e eficiência formam o tripé de um programa que promete tornar a indústria automotiva nacional mais sustentável e competitiva.
“Temos a chance de mostrar ao mundo que é possível crescer, inovar e descarbonizar ao mesmo tempo. O Brasil tem condições únicas de liderar essa agenda”, conclui o diretor da Anfavea.