MUDANÇAS CLIMÁTICAS AUMENTAM A PROLIFERAÇÃO DE DOENÇAS VIRAIS
A OMS alerta para aumento de casos de dengue, zika e chikungunya associados aos extremos do clima e
ao El Niño, em função da alternância de chuva e calor, que ajuda a proliferação do mosquito. Por: Dil Motta
A Organização Mundial da Saúde (OMS) concluiu que há indicadores de uma disseminação maior de doenças virais, como dengue, zika e chikungunya, associadas ao fenômeno climático El Niño. Entre as razões para esse avanço, figura a elevação da temperatura mundial, fenômeno que tem permitido ao mosquito transmissor da dengue, o Aedes aegypti, sobreviver por mais tempo, inclusive em ambiente em que antes isso não ocorria, como nos países de clima temperado.
No Brasil, o aumento de casos de dengue e de outras arboviroses transmitidas pelo Aedes aegypti, como zika e chikungunya, acontecia nos meses de abril e maio. No entanto, o País registrou mais de 2 milhões da doença entre 1º de janeiro e 22 de março. De acordo com as autoridades sanitárias, mudanças climáticas e o fenômeno El Niño contribuíram para esses números altos já no início do ano, por provocar alternância de chuva e calor, o que ajuda a proliferação do mosquito.
Sandra Hacon, pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), explica que o mosquito transmissor das doenças está se adaptando às temperaturas mais altas, em torno de 32 a 35 graus.
“Há casos de dengue no Brasil inteiro, o que mostra a capacidade de adaptação do Aedes aegypti. O calor intenso e as chuvas estão ajudando a disseminar doenças como dengue, zika e chikungunya. Antes, a gente dizia que o verão era a época da dengue. Agora não tem mais isso, porque nós estamos tendo verão o ano todo”, afirma a pesquisadora.
ADAPTABRASIL
Os impactos dessas mudanças climáticas em diversos setores econômicos são analisados por meio do Sistema de Informações e Análises sobre Impactos das Mudanças do Clima – AdaptaBrasil MCTI –, plataforma do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação que mostra os potenciais riscos à saúde e a outras áreas como recursos hídricos, segurança alimentar e energética, infraestrutura portuária, ferroviária e rodoviária e desastres geo-hidrológicos.
Segundo Jean Ometto, coordenador-geral do AdaptaBrasil e pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), a plataforma, lançada em 2021, foi desenhada para traçar um mapeamento detalhado sobre os possíveis impactos nos setores produtivos da sociedade.
“A plataforma nasceu de uma demanda em busca de explicação para o que está acontecendo com o clima e seus efeitos. É uma ferramenta que contribui para mapear o nível de impacto e de risco climático às quais o País está exposto, permitindo perceber diferentes vulnerabilidades em nível regional”, esclarece Ometto.
Em outubro do ano passado, foram lançados três novos índices de risco climático no Setor Saúde do AdaptaBrasil, em parceria com a Fiocruz. Os índices estão relacionados à ocorrência de leishmaniose tegumentar americana, leishmaniose visceral e malária.
“Os índices mostram a possibilidade de ocorrência do mosquito transmissor da malária e da leishmaniose. Estamos finalizando estudo sobre dengue e chikungunya. Chuva e temperatura têm relação muito próxima com a proliferação dos mosquitos. O próximo estudo vai observar as ondas de calor para mapear as doenças respiratórias com indicadores de qualidade do ar e temperatura”, explica o coordenador do AdaptaBrasil.
ONDAS EPIDÊMICAS
Segundo José Cechin, superintendente executivo do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS), os sistemas de saúde público e privado devem estar preparados para detectar onde surgem essas ondas epidêmicas e atuar com rapidez no tratamento das pessoas contaminadas. Na avaliação do executivo, os dados do AdaptaBrasil podem auxiliar os planos de saúde a detectar ondas endêmicas de diversas doenças, já que acompanham movimentos da temperatura e os avanços em áreas antes não alcançadas.
“A ferramenta (AdaptaBrasil) pode auxiliar a Saúde Suplementar a prever os riscos de aumento de custos e, com esses dados, definir programas de ações. A plataforma pode dar uma contribuição importante nessa direção”.
Jean Ometto informa que são oferecidos cursos de capacitação com o objetivo de habilitar profissionais para a utilização da ferramenta. Por meio do curso, é possível acessar informações da plataforma, incluindo os níveis de impacto e riscos climáticos no Brasil, para elaborar planos de adaptação climática específicos.
“A plataforma é aberta, e as análises estão disponíveis. Uma seguradora, por exemplo, pode navegar pela plataforma para colher esses dados que são robustos e confiáveis”, informa Ometto.
Para Sandra Hacon, pesquisadora da Fiocruz, as seguradoras de saúde podem aproveitar a ferramenta para prever a elevação do custo hospitalar em consequência do aumento das internações.
“As altas temperaturas provocam perda de produtividade e impactam a saúde. O novo normal já chegou, e teremos que nos adaptar e nos antecipar. Por isso, avaliamos o risco da ameaça climática. Não podemos esperar que o desastre aconteça, temos que agir antes. E as ferramentas para que possamos agir estão disponíveis”, conclui.