RESSIGNIFICAÇÃO DA MORADIA IMPULSIONA MERCADO IMOBILIÁRIO

RESSIGNIFICAÇÃO DA MORADIA IMPULSIONA MERCADO IMOBILIÁRIO

Mudanças de hábitos no pós-pandemia devem garantir mais um ano de bom desempenho do setor, que registrou recorde de negócios em 2021.

Por: Fernanda Thurler

O mercado imobiliário continua surpreendendo positivamente a economia nacional e deverá encerrar 2022 com índices positivos nos indicadores de performance, com os lançamentos e as vendas de imóveis residenciais em números bem próximos dos registrados em 2021, quando o setor teve um recorde de negócios. Isso, a despeito do ambiente desfavorável da conjuntura econômica (juros altos, aumentos dos custos da construção e dos índices de inflação), que levou a um cenário nada animador no período de abril a junho, quando os lançamentos de imóveis no País chegaram a cair 15,4%, enquanto as vendas recuaram 5,5%.

 

As projeções otimistas são compartilhadas por entidades representativas do setor de construção e incorporação, como a Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) e a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC). As vendas registraram aumento de 1,4% no semestre, em comparação ao primeiro semestre do ano passado, atesta o estudo “Indicadores Imobiliários Nacionais do 2º trimestre de 2022”, realizado pela CBIC em parceria com o Senai Nacional e com a Brain Inteligência Estratégica, divulgado em agosto último.

 

O levantamento aponta uma queda de 6% no número de lançamentos residenciais no primeiro semestre de 2022, em comparação com o mesmo período de 2021, mas as vendas cresceram. Na avaliação do presidente da CBIC, José Carlos Martins, os dados demonstram que o mercado apresenta interesse e demanda para comprar. “É importante destacar a linha de crescimento de vendas e lançamentos de 2017 até agora e que, a partir do segundo semestre de 2021, começou a ter certa estabilidade. Ou seja, apesar da crise econômica, o setor da construção civil permanece com previsibilidade, podendo ser considerado um grande suporte da economia brasileira”, afirmou Martins em entrevista coletiva realizada para divulgar o estudo.

 

Segundo o presidente da CBIC, a previsão para este ano é de crescimento do PIB de 3,5%. “Devemos crescer também no emprego, acompanhando toda a cadeia produtiva. Queremos que o Brasil entenda que a construção civil é a grande âncora da economia para evitar o ‘voo de galinha’. Nós somos a âncora que permite um crescimento sustentável”, reiterou.

 

VENDAS LÍQUIDAS

 

O aumento das vendas no setor de incorporação no primeiro semestre é corroborado por outro estudo, realizado pela Abrainc em parceria com a Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), referente ao período entre janeiro e maio: 26,6% de crescimento em comparação a igual período do ano passado, o que equivaleu à comercialização de 74.570 unidades.

 

Na mesma pesquisa, a Abrainc informa que, como resultado, as vendas líquidas (calculadas com base no volume de vendas e de unidades distratadas em um dado período) acumulam alta de 28%, em paralelo a um recuo de um ponto percentual na relação entre distratos e vendas. Os empreendimentos associados ao Programa Casa Verde Amarela (CVA) foram responsáveis pela maior parcela das unidades lançadas (65,8%), comercializadas (72,2%) e entregues (88,1%) no balanço parcial de 2022, divulgado pela Abrainc.

 

Por sinal, uma das principais causas do otimismo do setor quanto à manutenção do crescimento este ano são as mudanças realizadas no programa, que possibilitaram a retomada das contratações. Segundo dados da CBIC, somente em julho, o CVA apresentou crescimento de 20% no volume de contratações em relação ao mesmo mês de 2021, e a tendência até meados de agosto era de manutenção do mesmo ritmo, lembrando-se que, entre abril e maio, o programa havia registrado queda de 36,5% nos lançamentos e de 14,6% nas vendas. A avaliação dos especialistas do setor é que o aumento nos custos de construção impactou de forma direta os empreendimentos do CVA, que acabaram sendo adiados ou cancelados nos últimos meses, principalmente em razão de o reajuste nos preços dos imóveis não ter sido acompanhado pela elevação do poder de compra da população.

 

Com isso, o Governo Federal vem implementando uma série de medidas de estímulos para desafogar o CVA, com aumento na liberação de subsídios, adequação das faixas de rendas dos mutuários e ampliação nos prazos de financiamento. Até o fim do terceiro trimestre, a previsão é que a Caixa passe a oferecer financiamento imobiliário com prazo de pagamento de até 35 anos dentro do CVA (o prazo máximo para esse tipo de operação atualmente é de 30 anos).

 

A pesquisa da Abrainc atesta que os imóveis de Médio e Alto Padrão (MAP) puxaram a expansão. O crescimento foi de 145,3%. Foram vendidas 19.620 unidades. Na argumentação dos especialistas da entidade, o resultado se deve ao fato de muitos compradores estarem enxergando uma boa oportunidade para compras de ativos imobiliários, com expectativa de valorização futura nos preços dos imóveis.

 

Dentro dessa premissa de crescimento do mercado de incorporação, os financiamentos imobiliários devem alcançar um volume total de R$ 260 bilhões em 2022, um aumento de 2% na comparação com o ano anterior, de acordo com previsão feita pela Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip). O número representaria um recorde histórico para o segmento, mesmo com a desaceleração em relação ao ano passado, em que foi registrado crescimento de 46%.

 

MAIS CRÉDITO

 

O financiamento de imóveis é uma linha de crédito elaborada pelos bancos com o intuito de facilitar a compra da casa própria. O cliente que contrata esse crédito pode utilizar o valor obtido para comprar imóvel novo, usado, adquirir terrenos ou começar uma construção. A Caixa Econômica Federal, maior financiadora imobiliária do País, projeta crescimento de 10% nas concessões de empréstimos para aquisição de imóveis em 2022.

 

Embora haja uma desaceleração em relação ao ano anterior — devido ao ciclo de alta da taxa básica de juros (Selic) — a tendência é que haja ampliação do crédito. O resultado deverá ser superior ao projetado pelas demais instituições do mado mercado de home equity, conhecido como Crédito com Garantia de Imóvel (CGI). Peixoto argumenta que a criação do seguro imobiliário com a ampliação do escopo de cobertura às operações de compra e venda dentro dessas duas modalidades, já bastante difundidas no setor imobiliário, poderá significar um crescimento significativo do mercado.

 

“No caso dos consórcios, representaria no curto prazo aumento de 18% no volume da carteira. No home equity, pode significar acréscimo de 12%”, avalia, explicando que, no segundo caso, as previsões com relação ao mercado são de médio prazo. Também no que diz respeito à performance do seguro garantia, o desempenho do setor imobiliá- “No caso dos consórcios, (a criação do seguro imobiliário) representaria no curto prazo aumento de 18% no volume da carteira. No home equity, podem significar acréscimo de 12%.” Lincoln Peixoto, FenSeg setor bancário, já que a Caixa conta com taxas de juros mais baixas e linhas de crédito menos impactadas pela inflação, como a do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE).

 

Os financiamentos imobiliários usam como parâmetro o rendimento da poupança, valor que não reflete a variação total da Selic. Assim, além de não serem tão afetadas pelos juros, as famílias que buscam financiar a casa própria podem contar também com as facilidades no financiamento pelo Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e com linhas de crédito especiais oferecidas pelas instituições bancárias. Somente em julho, o crédito imobiliário atingiu R$ 18 bilhões, melhor resultado do ano e o segundo maior volume para o mês na série histórica, embora inferior ao montante observado no mesmo período de 2021. De acordo com os dados mensais da Abecip, foram financiados 73,1 mil imóveis, quantidade 18,5% maior que em junho e 10% inferior ao mesmo mês do ano passado.

 

SEGURO HABITACIONAL

 

Com desempenho atrelado ao da carteira de crédito relacionado ao financiamento imobiliário, o seguro habitacional também vem registrando bons índices de crescimento. Até junho deste ano, movimentou em prêmios R$ 2,77 bilhões, com um crescimento de 12,35% em comparação a igual período em 2021. A perspectiva é encerrar o ano com um volume em prêmios de R$ 5,77 bilhões contra os R$ 5,01 bilhões arrecadados em 2021, o que representaria um crescimento de 13,77%. A informação é do presidente da Comissão de Seguro Habitacional da FenSeg, Lincoln Peixoto, para quem o valor poderá ser 20% maior a partir do estabelecimento do seguro habitacional como seguro imobiliário.

 

Ele explica que Superintendência de Seguros Privados (Susep) e o Conselho Monetário Nacional (CMN) discutem a ampliação da cobertura do seguro habitacional, hoje restrito aos imóveis financiados dentro do SBPE, para todo o mercado imobiliário – o que incluiria, de imediato, as operações de compra e venda de imóveis pelo sistema de consórcio e também dentro chamado mercado de home equity, conhecido como Crédito com Garantia de Imóvel (CGI).

 

Peixoto argumenta que a criação do seguro imobiliário com a ampliação do escopo de cobertura às operações de compra e venda dentro dessas duas modalidades, já bastante difundidas no setor imobiliário, poderá significar um crescimento significativo do mercado. “No caso dos consórcios, representaria no curto prazo aumento de 18% no volume da carteira. No home equity, pode significar acréscimo de 12%”, avalia, explicando que, no segundo caso, as previsões com relação ao mercado são de médio prazo. Também no que diz respeito à performance do seguro garantia, o desempenho do setor imobiliário vem representando um incremento de vendas.

 

Hoje, a maior parte da arrecadação de prêmios dessa modalidade está no setor público (algo como 90%), mas a expectativa da indústria de seguros é ampliar a participação do setor privado, já que crescimento do mercado de imóveis vem contribuindo de forma significativa para alcançar tal objetivo. De acordo com o vice-presidente da Comissão de Riscos de Crédito e Garantia da Fenseg, Átila Santos, o movimento de ressignificação da moradia, representado pelo “boom” de negócios imobiliários no País nos últimos dois anos (especialmente no segmento de alto padrão) já causou certa mudança: “Hoje, a relação setor público x setor privado está em 88% e 12%, e eu diria que a modalidade imobiliária representa entre 20% e 30% do volume de prêmios referentes ao setor privado”.

 

Dentro desse contexto, o executivo avalia que o crescimento dos negócios do segmento de lajes corporativas, especialmente com a instalação de galpões logísticos nos arredores dos principais municípios do País, vem contribuindo para esse aumento da venda de seguros no setor privado. Ainda no mercado imobiliário, ele destaca o seguro fiança locatícia como um importante instrumento de ampliação da base segurada.

 

 

“Hoje, a relação setor público x setor privado (do seguro garantia) está em 88% e 12%, e eu diria que a modalidade imobiliária representa de 20% a 30% dos prêmios do setor privado.” Átila Santos, FenSeg

 

Para se ter uma ideia, somente em 2020 a arrecadação da carteira atingiu um crescimento de 76%. Mas, de acordo com as estatísticas da Fen- Seg, o seguro garantia representa menos que 3% do número de imóveis alugados no País. Santos afirma que a tendência é de ampliação dessa base, principalmente em razão de algumas medidas adotadas pela Susep, como, por exemplo, a nova regra estabelecendo que as apólices sejam emitidas pelo prazo total do contrato de locação. Antes, elas eram emitidas pelo prazo de 12 meses, e o locatário precisava renová-la durante a vigência do contrato.